quinta-feira, 15 de abril de 2021

Os vizinhos não se podem escolher


 

Esta frase de Samora Machel, primeiro Presidente de Moçambique, é daquelas em que ele mais terá acertado. Referia-se à relação que a antiga colónia ultramarina tinha que manter com a República da África do Sul e o seu apartheid racista, dada a vizinhança.

Eu refiro-me à sorte ou azar de quem precisa de tomar a vacina contra a Covid19.

 

Há dois irmãos gémeos, a Rita e o Jaime. Ela reside nas Olaias e ele em Loures. Distam cerca de 20 quilómetros, mas nessa distância reflecte-se a verdade de Samora Machel.

A Rita recebeu uma chamada telefónica para estar no Centro de Saúde das Olaias no dia seguinte às 10h14 minutos, para apanhar a vacina. Achou graça à exactidão da hora e pensou o que qualquer português pensaria, sabendo como tudo funciona neste país. Mas cumpriu e chegou com 5 minutos de antecedência. À hora indicada foi chamada. Entretanto constatou o cuidado que existiu com ela e os outros idosos (ou não), no acompanhamento, no oferecimento de um lugar para se sentar se precisasse. Depois da vacina, esperou a meia hora prevista e depois foi embora. Como se estivesse numa clínica privada. E marcaram-lhe o dia, com hora e minuto, para receber a segunda dose. E tudo se passou como da primeira vez.

Ao Jaime coube a fava. Recebeu a chamada telefónica e marcaram-lhe a hora. Uma hora certa. 10h! Ele sabia o que se tinha passado com a irmã e foi confiante. Pobre idiota que ainda confia. Marcaram centenas de idosos para a mesma hora. Chuva e sol, espera na rua de pé, foi bónus do Centro de Saúde de Loures para os seus idosos. A vergonha e a incompetência. À comunicação social esclareceram que a culpa era dos idosos que foram antes da hora, desmentido o que esses idosos estavam a dizer à mesma comunicação social.

 

Na realidade não é apenas uma questão de vizinhança, isto é, de localização. É questão de serviços que estão confiados a pessoas incompetentes para o desempenhar. É o país que temos.

A Câmara de Loures informa que cede o espaço e alguma logística e não tem mais responsabilidades. Do Centro de Saúde de Loures, nenhum telefone funciona, oportunamente, enquanto os idosos se aguentam.

Eu diria que se lá no Centro de Saúde, o ou os responsáveis pelo processo agiriam de modo diferente se tivessem pais idosos. Mas do que sei como tantas pessoas tratam (não tratam) dos pais ou avós idosos, nem digo nada para além de citar Samora Machel.

E fico a pensar, por que será que uns têm sorte e outros azar? Por que será que, por trabalharem para o Estado, os incompetentes não são castigados ou despedidos?

Não sei.

 

Orlando de Carvalho

 

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