Fiz uma pequena recolha de notícias relativas à maneira como as mulheres são tratadas nos nossos dias.
Cito as fontes no final de cada notícia.
Não foram editadas as ortografias.
Foram eliminadas as ligações exteriores.
DIA DA MULHER
Um estupro coletivo a cada quatro horas na Índia: caso de brasileira expõe histórico assustador de violência sexual
Território indiano é considerado um dos mais perigosos do mundo para mulheres, com um estupro registrado a cada 17 minutos
O caso da brasileira naturalizada espanhola que foi estuprada por sete homens em uma região remota do leste da Índia, por onde viajava com o marido, colocou o histórico assustador de violência sexual do país asiático sob os holofotes no fim de semana. O território indiano é considerado há anos um dos mais perigosos do mundo para as mulheres: estimativas oficiais apontam que ao menos três estupros ocorrem a cada hora no país — e um estupro coletivo a cada quatro horas. Meninas e mulheres também correm alto risco de serem escravizadas, segundo pesquisas.
- Saiba mais: Turista brasileira vítima de estupro coletivo na Índia e marido recebem R$ 60 mil de indenização do governo
O estupro é um dos crimes mais comuns contra as mulheres na Índia. Em 2022, foram registrados 31.516 casos em todo o país — o equivalente a mais de 86 por dia ou quase um estupro a cada 17 minutos, de acordo com dados do Escritório Nacional de Registros Criminais, que publica o relatório “Crime in India” (Crime na Índia) desde 1953. Deste total, 2.118 casos são de estupro coletivo.
A maior parte das vítimas tem entre 18 e 30 anos (65,9%), mas também há casos de meninas menores de seis anos (0,3%) e de mulheres acima dos 60 anos (0,3%). O Rajastão, na fronteira com o Paquistão, registrou 5.399 casos de estupro no ano passado, o maior número entre os estados. Na capital nacional, Nova Délhi, foram 1.212 casos desse tipo, o mais alto entre os oito territórios da União.
Uma pesquisa da Fundação Thomson Reuters concluiu em 2018 que a Índia era o país mais perigoso do mundo para ser mulher devido ao alto risco de violência sexual contra elas, bem como ao tráfico de pessoas para trabalho doméstico, trabalho forçado, casamento forçado e escravidão sexual, entre outros motivos.
Os resultados foram baseados em uma pesquisa com 550 especialistas em questões femininas em todo o mundo, incluindo acadêmicos, profissionais de saúde, formuladores de políticas e funcionários de ONGs. Os especialistas foram solicitados a considerar parâmetros como violência sexual e não sexual, tráfico humano, tradições culturais, assistência médica e discriminação.
Na edição anterior da pesquisa, realizada em 2011, a Índia aparecia em quarto lugar. Uma nova atualização ainda não foi publicada.
Realidade ainda pior
Os números oficiais são alarmantes, mas especialistas alertam que a realidade é ainda pior, com grande número de subnotificações. Muitos ataques não são denunciados, seja por vergonha devido ao estigma, seja pela falta de confiança no trabalho das autoridades, já que condenações raramente acontecem e muitos casos acabam estagnados no saturado sistema judicial do país.
“As vítimas de estupro têm muito medo de se manifestar, pois acreditam que não só não obterão justiça como também temem enfrentar humilhação por toda a vida por parte de suas famílias, comunidades e autoridades policiais”, afirmam os cientistas políticos Rudabeh Shahid, Kaveri Sarkar e Azeem Khan em artigo de janeiro de 2021 publicado pelo Atlantic Council, um centro de estudos baseado em Washington, nos EUA. “Esse estigma baseia-se no sexismo institucional intenso e no patriarcado, em que a concepção de honra está ligada ao corpo da mulher.”
A pressão pública foi tão grande que, em 2013, levou a mudanças na antiga definição de estupro no Código Penal, que passou a incluir assédio, perseguição e ataques com ácido, além de estender as sentenças de prisão e introduzir a pena de morte para os condenados por estupro de crianças de até 12 anos de idade. Mas a implementação de medidas contra os agressores tem sido fraca e deixa de fora os casos de estupro marital, segundo os especialistas do Atlantic Council.
“De fato, surgiram movimentos que levaram a reformas", avaliam. "No entanto, ainda há problemas sérios e as tendências sociais que os alimentam cruzam linhas sociais, econômicas, religiosas, étnicas e políticas."
Ativistas argumentam que as punições com pena de morte em casos recentes de grande repercussão pouco fizeram para alterar as estatísticas de estupro no país. Estudos também mostram que não há correlação entre a introdução da pena capital e a redução das incidências de estupro.
— Temos uma sociedade patriarcal na Índia, que dá mais importância aos homens; as mulheres geralmente são consideradas cidadãs de segunda classe — enfatizou Shruti Kapoor, ativista feminista e fundadora da organização Sayfty Trust, em entrevista à rede alemã Deutsche Welle. — As crianças internalizam isso em uma idade muito jovem; os desejos e as opiniões de uma menina não são considerados tão importantes quanto os de um menino. A criança do sexo feminino aprende a ser subserviente desde o início.
Sobreposição de violências
A violência contra as mulheres na Índia também perpassa questões étnicas. Em julho do ano passado, um vídeo mostrando duas mulheres sendo empurradas nuas entre uma multidão de homens no estado de Manipur, no nordeste do país, provocou a indignação de milhões de pessoas, depois de viralizar nas redes sociais e ganhar manchetes do país. Registrada em maio, a cena foi tachada — com dois meses de atraso — pelo primeiro-ministro Narendra Modi de “vergonhosa”.
O episódio ocorreu um dia após o início dos confrontos entre as comunidades meitei e kuki, que já deixaram cerca de 200 pessoas mortas e mais de 70 mil deslocadas. Na ocasião, um grupo de kukis que fugia para a floresta em busca de segurança foi interceptado por uma multidão de meiteis. Dois homens foram mortos e as mulheres do grupo tiveram que desfilar nuas, além de terem sido agredidas sexualmente pela turba.
A divisão de castas, do mesmo modo, se sobrepõe à violência de gênero na Índia. Em 2020, uma jovem dalit de 19 anos foi estuprada por quatro homens brâmanes — a mais alta casta hindu — no distrito de Hathras, no estado de Uttar Pradesh, norte do país. A adolescente chegou a ser internada em um hospital em Nova Délhi, mas morreu em decorrência de seus ferimentos. O caso provocou indignação global depois que as autoridades supostamente cremaram seu corpo à força, sem o consentimento de sua família. Apenas um dos acusados foi condenado pela Justiça indiana, que o julgou por homicídio culposo.
O estupro é um crime inafiançável sob o Código Penal indiano, mas em muitos casos os suspeitos conseguem fiança devido à falta de provas, disse Anuja Trehan Kapur, psicóloga criminal e advogada de Nova Délhi à rede alemã Deutsche Welle.
— Os acusados geralmente são protegidos pela polícia, por políticos ou até mesmo por advogados — acrescentou.
Um total de 445.256 casos de crime
contra mulheres foi registrado em 2022 na Índia, de acordo com dados do
Escritório Nacional de Registros Criminais. O número representa um aumento de
4% em relação ao ano anterior. A maioria desses crimes foi registrada sob o
Código Penal indiano como crueldade por parte do marido ou seus parentes
(31,4%), rapto de mulheres (19,2%), agressão a mulheres com intenção de ofender
sua dignidade (18,7%) e estupro (7,1%).
Fonte: https://oglobo.globo.com/
Abusos levam mulheres a atear fogo no próprio corpo no Paquistão, diz estudo
Violência doméstica está entre as principais causas citadas pelas pacientes ouvidas pela pesquisa para justificar a autoimolação
Os abusos cometidos contra mulheres no Paquistão têm levado muitas delas a atear fogo nos próprios corpos, resultando em morte em diversos casos. Os dados foram divulgados pelo PIMS (Instituto de Ciências Médicas do Paquistão, da sigla em inglês) e reproduzidos pela Radio Free Europe nesta quina (1).
Mulheres casadas de baixa renda têm as maiores taxas de autoimolação ou suicídio dessa forma no Paquistão. O estudo indica que 75 mulheres atearam fogo no próprio corpo em um período de seis anos, contra apenas 18 homens. Dessas, 65% eram casadas, e a maioria delas vinha de áreas rurais com acesso restrito a educação.
O fenômeno, relativamente raro em nações desenvolvidas, é bastante comum em países como Turquia, Irã, Afeganistão, Paquistão e outros do Sul da Ásia, aponta o estudo.
As causas vão desde a pobreza sistêmica, passando pela violência doméstica até as baixas taxas de alfabetização. Também contribui a oferta limitada de serviços de saúde mental, que aumenta o risco de comportamentos autodestrutivos. Conflitos conjugais e violência doméstica são frequentemente citados como desencadeadores.
Problemas domésticos
Um estudo entre 154 pessoas com queimaduras autoinfligidas, realizado em um distrito rural na província de Sindh, no sul do Paquistão, indicou que 63% das pacientes do sexo feminino tentaram suicídio, contra 37% dos pacientes masculinos. A maioria das mulheres relatou “brigas familiares e desarmonia conjugal” como causas.
“As pacientes do sexo feminino sofrem em grande parte de problemas domésticos, como brigas com maridos ou parentes”, disse Ehmar Al-Ibran, chefe do centro de queimados do Hospital Civil de Karachi. “Às vezes, elas enfrentam violência doméstica todos os dias”.
Violência de gênero
Uma pesquisa da Fundação Thomson Reuters indica que o Paquistão é o sexto país mais perigoso do mundo para as mulheres. Em 2020, mais de 2,2 mil mulheres sofreram alguma forma de violência, incluindo agressão sexual, violência doméstica e ataques com ácido. O número real, entretanto, é provavelmente muito maior, porque poucos casos são relatados.
Apesar dos avanços recentes na legislação de proteção à mulher no país, o cumprimento da lei tem sido reduzido. Muitas organizações de direitos das mulheres, como a Fundação Aurat, trabalham incansavelmente para aumentar a conscientização. De acordo com Mehnaz Rahman, diretora da entidade, as leis de proteção à mulher do país são louváveis, mas falta aplicá-las adequadamente.
Fonte: https://areferencia.com/asia-e-pacifico
Mulheres mulçumanas na Tailândia e Malásia sofrem agressões
Imprensa malaia denuncia a ocorrência de estupros coletivos. As vítimas são mulheres da comunidade rohingya retidas por traficantes em campos clandestinos
Mulheres da comunidade muçulmana rohingya retidas por traficantes em campos clandestinos da Tailândia e Malásia foram vítimas de estupros coletivos, e pelo menos duas ficaram grávidas, denunciou a agência estatal de notícias malaia Bernama.
A agência ouviu o depoimento de Nur Khaidha Abdul Shukur, uma mulher que passou no ano passado por um destes campos, perto de Padang Besar, na Tailândia.
"A cada noite, os guardas levavam duas ou três jovens atraentes rohingya do campo para um lugar clandestino. Os guardas as estupravam em grupo e duas mulheres ficaram grávidas", disse.
De acordo com a agência estatal, o marido de Shukur, Nurul Amin Nobi Hussein, também foi testemunha de atos similares em outros campos da região, perto da fronteira com a Malásia.
No mês passado, as autoridades descobriram vários campos clandestinos criados por traficantes de seres humanos, com fossas comuns e dezenas de corpos, na Tailândia e na Malásia.
Grande parte da comunidade rohingya, de 1,3 milhão de pessoas, vive no estado de Rakhine, noroeste de Mianmar, na fronteira com Bangladesh. O grupo é considerado pela ONU uma das minorias mais perseguidas do mundo.
O presidente americano, Barack Obama, pediu a Mianmar que pare de discriminar os rohingyas.
"Uma das coisas mais importantes é que deixem de discriminar as pessoas em função de sua aparência ou crenças", afirmou o presidente americano, em sua primeira referência pública à fuga de migrantes na Ásia.
"E os rohingyas são fortemente discriminados", disse à imprensa, utilizando o termo "rohingya", que irrita as autoridades birmanesas, que não reconhecem este grupo étnico, que considera como imigrantes ilegais procedentes de Bangladesh.
Há várias semanas, milhares de pessoas desta comunidade tentam fugir da miséria e viajam em barcos improvisados para tentar chegar às costas da Malásia, Indonésia, Tailândia ou Bangladesh.
Fonte: https://exame.com
Irão: Autoridades usam violência sexual para silenciar Movimento “Mulher Vida Liberdade”
6 Dezembro 2023
- As autoridades iranianas cometeram violações e outras formas de violência sexual, de forma impune, para reprimir o Movimento “Mulher Vida Liberdade”
As forças de segurança iranianas recorreram à violação e a outras formas de violência sexual – equivalentes a tortura e outros maus tratos – para intimidar e reprimir manifestantes pacíficos durante os protestos do Movimento “Mulher Vida Liberdade” em 2022, afirma a Amnistia Internacional num novo relatório publicado hoje.
O relatório de 120 páginas denominado “Eles violaram-me: Violência sexual usada como arma para esmagar o Movimento ‘Mulher Vida Liberdade’ no Irão” (em inglês,“They violently raped me: Sexual violence weaponized to crush Iran’s “Woman Life Freedom” uprising”) revela detalhadamente as provas cruéis de 45 sobreviventes – 26 homens, 12 mulheres e sete crianças. Por desafiarem décadas de opressão e de discriminação baseada no género, todas estas pessoas foram presas arbitrariamente e submetidas a violações, violações coletivas e/ou outras formas de violência sexual pelas forças de inteligência e de segurança do Irão.
Até à data, as autoridades iranianas não acusaram nem processaram nenhum funcionário pelos casos de violação e de outras formas de violência sexual documentados no relatório.
“A nossa investigação expõe a forma como os agentes dos serviços secretos e de segurança do Irão recorreram à violação e a outros tipos de violência sexual para torturar, punir e infligir lesões físicas e psicológicas duradouras aos manifestantes, mesmo a crianças de apenas 12 anos”, sublinha a secretária-geral da Amnistia Internacional, Agnés Callamard.
“Os serviços secretos e de segurança do Irão recorreram à violação e a outros tipos de violência sexual para torturar, punir e infligir lesões físicas e psicológicas duradouras aos manifestantes, mesmo a crianças de apenas 12 anos”
Agnès Callamard
Acrescenta ainda que “os testemunhos angustiantes recolhidos pela Amnistia Internacional apontam para um padrão mais amplo da utilização da violência sexual como uma arma-chave no arsenal da repressão das manifestações e da supressão da dissidência pelas autoridades iranianas, para se agarrarem ao poder a todo o custo”.
A Amnistia Internacional revela ainda como os procuradores e juízes iranianos não só foram cúmplices, ignorando ou encobrindo as queixas de violação dos sobreviventes, como também utilizaram “confissões” forçadas (extraídas sob tortura) para apresentar acusações falaciosas contra os sobreviventes e condená-los à prisão ou à morte. A secretária-geral da Amnistia Internacional destaca que “as vítimas ficaram sem recurso e sem qualquer reparação, sendo que aquilo que se vê é apenas impunidade institucionalizada, silenciamento e múltiplas cicatrizes físicas e psicológicas profundas infligidas a estas pessoas”.
“Aquilo que se vê é apenas impunidade institucionalizada, silenciamento e múltiplas cicatrizes físicas e psicológicas profundas infligidas a estas pessoas”
Agnès Callamard
O relatório revela que no conjunto de perpetradores destas violações e outras formas de violência sexual estão agentes da Guarda Revolucionária, da força paramilitar Basij e do Ministério dos Serviços Secretos, bem como diferentes ramos da força policial: como a Polícia de Segurança Pública (police amniat-e omoumi), a Unidade de Investigação da polícia iraniana (agahi) e as Forças Especiais da polícia (yegan-e vijeh).
Entre os sobreviventes encontram-se mulheres e raparigas que tinham tirado corajosamente os seus lenços da cabeça, mas também homens e rapazes que saíram à rua para exprimir a sua indignação face às décadas de discriminação e opressão baseadas no género.
A prevalência da violência sexual em repressão ao Movimento “Mulher Vida Liberdade” é difícil de quantificar, uma vez que o estigma e o pavor de represálias conduzem normalmente a uma subnotificação das denúncias. No entanto, a documentação pormenorizada da Amnistia Internacional indica que as violações documentadas fazem parte de um padrão mais vasto. A organização analisou 45 casos em mais de metade das províncias do Irão que, juntamente com os relatos de sobreviventes e outros antigos detidos sobre casos precedentes de violação/outras violências sexuais contra dezenas de manifestantes detidos, permitem chegar a esta conclusão. A Amnistia Internacional partilhou as suas conclusões com as autoridades iranianas a 24 de novembro, mas até agora não recebeu qualquer resposta.
O estigma e o pavor de represálias conduzem normalmente a uma subnotificação das denúncias. No entanto, a investigação da Amnistia Internacional indica que as violações documentadas fazem parte de um padrão mais vasto
“Não é isto que procuram com a libertação?”
O relatório documenta casos de violação e violação coletiva: 16 dos 45 sobreviventes cujos casos foram analisados pela Amnistia Internacional foram violados (seis mulheres, sete homens, uma rapariga de 14 anos e dois rapazes de 16 e 17 anos). Destes, seis – quatro mulheres e dois homens – foram violados em grupo por vários agentes do sexo masculino.
Os sobreviventes relatam que foram violados com bastões de madeira e de metal, garrafas de vidro, mangueiras e/ou com os órgãos sexuais e os dedos dos agentes. As violações ocorreram em centros de detenção e carrinhas da polícia, bem como em escolas ou edifícios residenciais ilegalmente adaptados como locais de detenção.
Farzad, sobrevivente que foi violado em grupo numa carrinha das Forças Especiais da polícia, partilhou à Amnistia Internacional: “Os agentes estavam à paisana e obrigaram-nos a virar para as portas e janelas do veículo, deram-nos choques elétricos nas pernas… Torturaram-me com espancamentos… que me partiram o nariz e os dentes. Baixaram-me as calças e violaram-me… Senti que estava a ser desfeito…”
Maryam, que foi violada em grupo num centro de detenção da Guarda Revolucionária, contou que os agressores lhes disseram que todas as mulheres ali eram obcecadas pelo órgão sexual masculino, sublinhando que era por essa razão que as violentavam. Acrescentavam ainda declarações como: “Não é isto que procuram com a libertação?”.
A Amnistia Internacional documentou ainda os casos de 29 sobreviventes que foram sujeitos a outras formas de violência sexual, envolvendo agentes do Estado que, de acordo com os seus relatos, agarraram, apalparam, bateram, esmurraram e os pontapearam; os obrigaram à nudez, por vezes em frente a câmaras de vídeo; lhes aplicaram agulhas e choques elétricos nos órgãos sexuais masculinos; cortaram à força o cabelo das mulheres e/ou arrastaram-nas violentamente pelos cabelos; e ameaçaram os sobreviventes de violação a si e aos seus familiares.
Todas estas formas de violência degradante foram ainda acompanhadas por agressões, açoites, choques elétricos, administração de comprimidos ou injeções não identificadas, recusa de comida e água e condições de detenção cruéis e desumanas. As forças de segurança iranianas também negaram sistematicamente cuidados médicos aos sobreviventes, nomeadamente para os ferimentos resultantes das violações.
Ausência de vias nacionais de acesso à justiça
A esmagadora maioria dos sobreviventes partilhou à Amnistia Internacional que não apresentou queixa após a libertação, por recear futuras agressões e por acreditar que o sistema judicial é um instrumento de repressão e não de reparação. Seis sobreviventes revelaram as suas marcas de tortura ou queixaram-se de abusos quando foram levados à presença de funcionários do Ministério Público para interrogatório enquanto ainda estavam detidos, mas foram ignorados.
Por outro lado, três sobreviventes apresentaram queixas formais, mas acabaram por ser obrigados a retirá-las ou deixaram de as apresentar após repetidas ameaças das forças de segurança ou meses de inação do Ministério Público. Um deles foi informado por um oficial de alta patente de que tinha confundido uma revista corporal com violência sexual.
A Amnistia Internacional também analisou uma fuga de informação de um documento oficial, datado de 13 de outubro de 2022 e publicado por um meio de comunicação social fora do Irão em fevereiro de 2023, que revela que as autoridades encobriram queixas de violação apresentadas por duas jovens contra dois agentes da Guarda Revolucionária durante as manifestações. O procurador-adjunto de Teerão aconselhou, no documento, que o caso fosse classificado como “completamente secreto” e sugeriu que se “encerrasse gradualmente [o caso] ao longo do tempo”.
As autoridades iranianas encobriram queixas de violação apresentadas por duas jovens contra dois agentes da Guarda Revolucionária durante as manifestações
A recuperar do trauma, mas a ansiar por justiça
As mulheres, os homens e as crianças sobreviventes relataram à Amnistia Internacional que continuam a lidar com os traumas físicos e psicológicos de todas as formas de violência que sofreram. A mãe de um estudante que foi violado partilhou que o seu filho se tentou suicidar duas vezes enquanto esteve detido.
Sahar, uma manifestante, relatou o impacto traumático da violência sexual sofrida às mãos das forças de segurança que lhe tiraram a roupa, exceto a roupa interior, e lhe tocaram nos seios e nos órgãos genitais, ao mesmo tempo que a ridicularizavam e ameaçavam de violação: “Eu costumava ser uma lutadora na vida. No entanto, ultimamente, penso muito no suicídio… Sou como uma pessoa que espera todo o dia pela noite para poder dormir”.
Zahra, uma mulher que sofreu violência semelhante, descreve as consequências psicológicas duradouras: “Acho que nunca mais voltarei a ser a mesma pessoa. Não encontrarão nada que me faça voltar a ser eu, que me devolva a minha alma… Espero que o meu testemunho resulte em justiça”.
“Acho que nunca mais voltarei a ser a mesma pessoa”
relato de uma vítima
Apelos da Amnistia Internacional
A Amnistia Internacional, pelas palavras de Agnès callamard, alerta que “sem vontade política e sem reformas constitucionais e jurídicas fundamentais, os obstáculos estruturais continuarão a afetar o sistema judicial iraniano, que tem revelado repetidamente a sua vergonhosa incapacidade e falta de interesse para investigar eficazmente os crimes previstos no direito internacional”.
A organização lembra ainda que, uma vez que não existem perspetivas de justiça a nível interno, a comunidade internacional tem o dever de apoiar os sobreviventes e de atuar para a exigência de justiça:
“A comunidade internacional deve apoiar a extensão do mandato da Missão de Averiguação das Nações Unidas para o Irão, a fim de garantir que um mecanismo independente continue a recolher, preservar e analisar provas de crimes ao abrigo do direito internacional e de outras violações graves dos direitos humanos. Exortamos os Estados a iniciarem investigações criminais nos seus próprios países contra os presumíveis autores de crimes, ao abrigo do princípio da jurisdição universal, com vista à emissão de mandados de captura internacionais”, conclui Agnès Callamard.
Fonte: https://www.amnistia.pt/
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