quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Das tribos aos partidos



Talvez tenha havido um tempo em que as tribos conseguiram existir sem um chefe, conquanto mesmo entre os animais seja comum que algum dos membros do grupo ou tribo dirija os demais. Talvez na espécie humana a vida em comunidade e sem chefia seja mais um sonho ou uma esperança de um futuro paradisíaco que um passado perdido ao contrário das teorias que defendem o materialismo histórico.
A chefia da tribo concretiza-se de duas formas. Ou pela força ou pela escolha dos seus membros através de um processo a que chamamos normalmente eleição. Qualquer das fórmulas tem imensas variantes. Na primeira estão incluídas as monarquias e as ditaduras. Mesmo as monarquias em regimes democráticos tiveram a sua origem no poder absoluto conquistado pela força. Na segunda, revêm-se as várias formas de democracia.
As tribos associaram-se e originaram as nações, que em muitos aspectos são tribos grandes, mas as associações iniciais, quase familiares, mantiveram-se.
É disto que trata, ou devia tratar, a eleição autárquica. A assembleia, os vizinhos, elege aquele, ou aqueles, que passa a dirigir a vizinhança, aldeia, bairro, ou outra estrutura que seja. O eleito deve ser relativamente bem conhecido de quase todos os moradores no aglomerado habitacional considerado e merecer a confiança destes para lhes resolver da melhor forma os seus problemas.
Nisto deviam consistir as eleições autárquicas. Mas o tribalismo está ultrapassado e as eleições locais tratam essencialmente de processos em que umas associações de pessoas bem falantes e pouco dadas ao trabalho, chamadas partidos políticos, tratam de ocupar os locais de chefia da aldeia, do bairro, da vila, da cidade, de modo a viverem bem, normalmente é mais de continuarem a viver bem, à custa dos residentes, e continuamente prometendo tratar dos assuntos da Polis, isto é, da comunidade local, não cumprindo, mostrando-se arrependidos, melhor, inventando justificações para não o ter feito, e prometendo que desta vez é que é. E os membros da tribo, não se sabe por que razão, continuam a eleger membros dessas associações, os tais partidos.
Em relação às nações, tudo acontece da mesma forma.
Os partidos escolhem pessoas da sua confiança que permitam que os seus associados continuem a viver bem, trabalhando pouco enquanto arranjam esquemas para as gentes da nação votarem nos seus candidatos. E as gentes da nação, vá-se lá saber por quê, continuam a votar neles.
Deste modo, um bom homem que defendeu os interesses dos seus conterrâneos nas Caldas da Rainha pode ser destacado pelo partido para ser candidato por Loures, como se percebesse alguma coisa dali e mais tarde ser candidato pelo seu partido em Leiria ou Faro.
Como pode um portuense ser presidente da Câmara de Lisboa ou um lisboeta presidir à edilidade portuense?
Um deputado nacional eleito pelo Distrito de Bragança, deve votar no Parlamento em defesa dos interesses daqueles que o elegeram ou de acordo com as directivas do partido político que, em última análise, é quem lhe paga o ordenado, quem lhe garante uma boa vida e quem, no final da carreira parlamentar lhe vai arranjar um cargo profissional, num ramo que ele desconhece em absoluto, mas que lhe vai render lucros na proporção em que foi fiel ao partido? Ou deve ainda votar de acordo com o empresário que lhe pode garantir no final do tempo de serviço parlamentar uma espécie de reforma milionária como pagamento desse voto?
Parece que anda tudo maluco, pelo menos quem vota, quem dá o seu cheque assinado e em branco, não sabe a quem.
A vida das pessoas e das comunidades não é, assim, mais que uma brincadeira de crianças, um futebol. Apoio o partido X-ista ou sou fã do partido Y-ista com o mesmo empenho que apoio o Benfica ou sou fã do Sporting. Isto é uma vergonha!

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